Filipe Lovato Batich ADVOGADO, MESTRE EM DIREITO PENAL PELA USP
Rhasmye El Rafih ADVOGADA, MESTRA EM DIREITO PELA USP
É ASSEGURADA A INATIVIDADE AO INVESTIGADO ANTE APURAÇÕES EM SEU DESFAVOR. NESSE SENTIDO, ELE POSSUI AMPLA LIBERDADE DE DECIDIR PELA RESPOSTA OU PELO SILÊNCIO
1. CPIs E AUTOINCRIMINAÇÃO
O art. 58, § 3º, da Constituição Federal dispõe sobre o poder típico de fiscalização, ativo por parte do Poder Legislativo, por meio da criação de comissões parlamentares de inquérito (CPIs) com poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos nos regimentos das respectivas casas (MORAES, 2010, p. 425). Politicamente, esse é um direito subjetivo das minorias parlamentares, como já reconheceu o Supremo Tribunal Federal (STF − RTJ 163/176).
A mesma corte também delimitou que, em razão de deterem o “poder instrutório das autoridades judiciais – e não maior que o dessas – a elas [às CPIs] se poderão opor os mesmos limites formais e substanciais oponíveis aos juízes, dentre os quais os derivados das garantias constitucionais contra a autoincriminação, que tem sua manifestação mais eloquente no direito ao silêncio dos acusados” (HC 79.244/DF).
O princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se detegere), em sua vertente de direito ao silêncio, vem sendo tratado de forma divergente pelos ministros do STF, quando exercido perante as CPIs. Alguns ministros entendem que esse princípio reforça, inclusive, a faculdade de o investigado não comparecer ao ato a que foi intimado (HC 171.438/DF). Outros sustentam que o investigado é obrigado a comparecer ao depoimento marcado, podendo fazer uso de seu direito ao silêncio quanto a perguntas de cujas respostas possam lhe resultar prejuízo (HC 119.941/DF).
2. REVOLVIMENTO SOBRE O PRINCÍPIO DA NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO
Durante os trabalhos da CPI da Pandemia, instaurada no Senado Federal, alguns intimados a prestar esclarecimentos não conseguiram decisões facultando o não comparecimento, razão pela qual se mantiveram em silêncio durante todo o ato. Essa postura acirrou os ânimos dos membros da CPI, sobretudo em relação a questionamentos que, em tese, não possuíam relação com as investigações1.
Em 12 de julho de 2021, o presidente do STF proferiu decisão monocrática nos autos do Habeas Corpus 204.422/DF, impetrado pelos defensores de uma intimada pela CPI da Pandemia, para que a paciente pudesse exercer o direito ao silêncio somente em relação aos fatos que a incriminassem, mas impondo que fosse considerada testemunha em relação aos demais, tendo o dever de depor e de dizer a verdade.
Em que pese a paciente ter tido seus sigilos telemáticos quebrados pela CPI antes da sua intimação2, o que já lhe deveria conferir o status de investigada, a decisão dispôs que sua posição era híbrida, fazendo com que ostentasse os papéis de investigada e testemunha concomitantemente, o que lhe atrairia garantias e deveres distintos3.
No dia seguinte, em razão de a paciente ter optado por exercer seu direito ao silêncio, tanto sua defesa quanto a CPI opuseram embargos de declaração com o fim de clarificar o teor da decisão liminar. O primeiro, para clarificar se a aferição da autoincriminação é prerrogativa da defesa, ao passo que o segundo objetivou determinar as consequências jurídicas à paciente quando ela se recusasse a responder sobre fatos que, em tese, não a incriminassem (HC 204.422/DF).
A decisão do presidente do STF sobre os dois embargos opostos dispôs que: (i) a autoincriminação é um direito subjetivo, sendo que o juízo sobre seu conteúdo cabe ao seu titular; e (ii) que não existe nenhum direito fundamental absoluto, cabendo à CPI o poder-dever de verificar eventual abuso do exercício do direito de não incriminação e adotar as medidas legais cabíveis. Assim, segundo o ministro do Supremo, cabe à CPI garantir balizas necessárias para que investigados, vítimas e testemunhas possam exercer, nos limites próprios, seus direitos fundamentais, inclusive referente à não autoincriminação (HC 204.422/DF).
O referido princípio é inerente à posição de investigado, considerando sua natureza jurídica de defesa pessoal negativa (LOPES JR., 2020, p. 118). Assim, não se deve
admitir vulnerações por autoridades públicas quando a pessoa que o exercer tiver a potencialidade de vir a ser sancionada pelos fatos apurados, mesmo quando rotulada formalmente como testemunha.
3. A ORIGEM DO PRINCÍPIO DA NÃO AUTOINCRIMINAÇÃO
A origem do contemporâneo princípio nemo tenetur se detegere é anglo-americana.
Na Inglaterra, o princípio da não autoincriminação (privilege against self-incrimination) resultou de uma evolução jurisprudencial. O direito ao silêncio, dimensão do princípio da não autoincriminação, surgiu baseado em benefício da testemunha (witness privilege) que lhe assegurava o direito de recusar-se a depor sobre qualquer questão que possivelmente a incriminasse. Porém, não havia renúncia parcial. Se a testemunha respondesse a qualquer pergunta estaria configurada a renúncia (waiver) ao benefício (QUEIJO, 2012, p. 47).
Nos Estados Unidos a origem foi constitucional, vinculada à proteção individual contra possíveis inovações pelo governo federal a ser constituído. A quinta emenda à constituição estadunidense, de 1791, dispõe que nenhum indivíduo pode ser compelido a se autoincriminar em casos criminais (shall not be compelled in any criminal case to be a witness against himself).
Em 1966, com base na jurisprudência da suprema corte estadunidense, especificamente no caso Miranda v. Ariz, dispositivos de proteção (protective devices) foram criados com o fim de balizar as autoridades durante interrogatórios e tutelar o princípio, dentre eles: (i) qualquer indivíduo em custódia ou que será objeto de interrogatório precisa ser previamente cientificado sobre o seu direito de permanecer em silêncio (right to remain silent); e, (ii) o indivíduo possui a liberdade, a qualquer momento, de exercer seu direito ao silêncio e, quando exercido, o interrogatório deve ser encerrado (right to cut off questioning) (LAFAVE et al., 2004, p. 292).
Julgamentos mais recentes apontam que o exercício do direito ao silêncio pelo interrogado deve ser sempre explicitamente manifestado por ele, para que não haja dúvidas sobre a sua invocação ou sobre sua renúncia (HARVARD, 2021, p. 2.257-8).
Considerando a acepção ampla do princípio da não autoincriminação, uma análise casuística não prescinde da verificação do seu âmbito de proteção e fundamento interpretativo.
4. ÂMBITO DE PROTEÇÃO E FUNDAMENTO INTERPRETATIVO
O princípio da não autoincriminação se desdobra no direito ao silêncio e no direito de não apresentar provas autoincriminadoras (BEDÊ JÚNIOR; SENNA, 2009, p. 38).
O âmbito de proteção do direito ao silêncio assegura que investigados: (i) não sejam obrigados a depor contra si; (ii) não tenham o dever de se declararem culpados; e (iii) tenham a faculdade de mentir (GREVI, 1972, p. 44-5), desde que eventual mentira não prejudique terceiros4.
Por sua vez, decorrem do direito de não apresentar provas autoincriminadoras as faculdades de: (i) não colaborar com a investigação/instrução; e (ii) não participação ativa nos procedimentos sancionatórios, tanto penais quanto de natureza administrativa.
O fundamento interpretativo geral do princípio da não autoincriminação é o de que o investigado não pode sofrer nenhum prejuízo jurídico em razão do exercício do silêncio e da sua negativa em colaborar com a atividade probatória da acusação (LOPES JR., 2020, p. 119), como dispõe o art. 186, parágrafo único, do Código de Processo Penal.
Para a análise crítica da aplicação desse princípio, é fundamental a compreensão de seus impactos em relação aos diversos sujeitos envolvidos em procedimentos acusatórios.
5. A QUEM SE APLICA O NEMO TENETUR SE DETEGERE NO BRASIL
O princípio da não autoincriminação é previsto no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (art. 14.3, g) e na Convenção Americana de Diretos Humanos (8º, 2, g), ambos ratificados pelo Brasil. A Constituição Federal brasileira trata expressamente apenas a dimensão do direito ao silêncio, no art. 5º, LXIII. Está ele também disposto em diversos dispositivos no Código de Processo Penal, especialmente pelas modificações trazidas pela Lei 10.792/03.
Apesar de consagrado expressamente ao preso, é o direito ao silêncio estendido pela doutrina a todo indiciado ou acusado (FERNANDES, 2003, p. 279). Há autores que o tratam como um direito absoluto, ao passo que outros admitem ponderações e restrições no confronto com interesses diversos, mas o núcleo essencial face à autoincriminação deve ser sempre preservado (MENDES, 2020, p. 136).
Contudo, não é somente o indiciado ou o acusado em processo penal que tem direito ao silêncio. Igualmente, o investigado ou averiguado contra o qual ainda não existam indícios convergentes de autoria de infração penal faz jus ao direito ao silêncio. Quanto à testemunha, o direito ao silêncio poderá ser exercido sempre que a pergunta formulada potencialmente conduzir à sua autoincriminação, seja sobre fato estranho – ou não – à apuração (QUEIJO, 2012, p. 239-240). Até porque no ordenamento jurídico brasileiro há papéis marcados para cada ator da relação processual.
Em um processo acusatório o juiz deve ser imparcial como julgador, o Ministério Público deve promover a ação penal e o advogado deve garantir a defesa técnica de seu cliente. Caso haja suspeições ou impedimentos que afetem a imparcialidade judicial, outro deve julgar a causa.
Da mesma maneira, o ofendido, investigado e testemunhas também possuem papéis demarcados. A vítima não está sujeita às penas de falso testemunho em razão de seu interesse no desfecho da causa. O investigado, além de possuir o direito ao silêncio, goza de uma série de outras garantias constitucionais, como contraditório, ampla defesa e presunção de inocência. Por sua vez, a testemunha, em tese sujeito juridicamente desinteressado, tem o dever legal de dizer a verdade, podendo incorrer no crime de falso testemunho se assim não agir. Além disso, quando o investigado ou réu decidir colaborar com as autoridades, há a renúncia expressa ao direito ao silêncio, devendo sempre dizer a verdade, nos termos do art. 4º, § 14, da Lei 12.850/13.
Como um juiz não pode se travestir de acusador, o indivíduo a ser potencialmente acusado não pode ser vertido em testemunha em um mesmo ato, uma forma de lhe impor o dever de dizer a verdade, mediante coações, ameaças e outros expedientes intimidatórios.
Em razão de o interrogatório ser um meio de defesa, a garantia da ampla defesa, em seu aspecto negativo, lhe é intrínseca, não podendo sofrer interferências por parte de quem investiga, posto que não goza da imparcialidade necessária para aferir, in
concreto, o que extrapolaria – ou não – essa garantia fundamental. Interpretação em sentido contrário viola o próprio modelo acusatório.
Assim, padece de contradição a decisão analisada, pois, se investigados, vítimas e testemunhas devem exercer, nos limites próprios, seus direitos fundamentais, não pode existir sobreposição desses papéis em um mesmo indivíduo no contexto da mesma investigação, sob pena de dar vazão a uma lógica esquizofrênica que esvazia direitos e garantias fundamentais.
6. COAÇÃO POR PARTE DO INTERROGADOR
Tratamentos apoteóticos à reconstituição de fatos no contexto de procedimentos investigatórios retrocedem à tradição inquisitorial da Idade Média, na qual a confissão era considerada a “rainha das provas” e condição para a expiação.
Como reação a essa tendência emergiu o princípio da não autoincriminação como verdadeiro limite à verificação da verdade (CÓRDOBA, 2005, p. 279-280), assegurando que o investigado não seja de qualquer forma coagido ou engodado a fornecer meios de prova contra a sua defesa (ANDRADE, 1992, p. 21).
Por essa razão, eventual confissão deve ser sempre livre de qualquer pressão ou ameaça (LOPES JR., 2020, p. 116), realizada de forma direta ou expressa, não havendo dúvidas quanto: (i) a ciência do indivíduo sobre seu direito ao silêncio; e (ii) sobre ato emanado de autodeterminação que resulte na renúncia a ele.
A Corte Europeia dos Direitos Humanos tem garantido o exercício do direito de o acusado não depor contra si mesmo, desdobramento do direito ao silêncio, também na fase inquisitiva. Ademais, tem se insurgido em face de coações que resultem na consequente violação do princípio do devido processo legal (CHIAVARIO, 2001, p. 198).
Nesse mesmo sentido, a Corte Interamericana de Direitos Humanos, no caso Herrera Espinoza e outros vs. Equador (2016), decidiu:
A garantia do exercício material do direito de defesa é a proibição de que uma pessoa seja obrigada a se autoincriminar ou que sua confissão seja obtida mediante coação. […] a prova de qualquer tipo de coação que vulnere a expressão espontânea da vontade da pessoa, implica necessariamente na obrigação de excluir a evidência do processo judicial.
Em outros casos, tais como Cabrera García y Montiel Flores vs. México (2010) e Ruano Torres y otros vs. El Salvador (2015), a Corte Interamericana de Direitos Humanos decidiu que, de acordo com o art. 8.3. da Convenção Americana de Diretos Humanos, eventual confissão só é válida se realizada sem coação de qualquer natureza, não se limitando à existência de tortura. Nesse sentido, estabeleceu que a lógica acusatória de um sistema que se pretenda democrático condiciona o Estado a não utilizar qualquer meio de coação na produção de provas no contexto de procedimentos investigatórios.
Não por acaso, sustenta-se que o princípio da não autoincriminação não comporta descontinuidades ou gradações nas diferentes fases da intervenção estatal, uma vez que corresponde a uma emanação da dignidade humana e matriz jurídico-constitucional do princípio da presunção da inocência (ANDRADE, 1992, p. 131).
CONCLUSÃO
Em que pese a recente decisão do presidente do STF no contexto da CPI da Pandemia, o fato de estar intimamente relacionado à atividade defensiva não admite relativizações ao princípio da não autoincriminação, especialmente na vertente do direito ao silêncio assegurado ao indivíduo que possa ser alçado à posição de investigado, mesmo que seja formalmente tratado como testemunha.
A natureza jurídica de autodefesa negativa que ostenta o princípio da não autoincriminação assegura a inatividade do investigado ante apurações em seu desfavor, ainda que potenciais. Nesse sentido, o investigado possui ampla liberdade de decidir o que responder ou se não deve responder.
Em sendo a ausência de prejuízo ao investigado o fundamento interpretativo do referido princípio, ameaças de expedientes coercitivos representam uma verdadeira coação para a confissão, estratégia típica de tradições inquisitoriais. Exigir a manifestação do investigado sobre qualquer ponto que ele entenda ser-lhe prejudicial é uma violação à garantia fundamental da ampla defesa e do próprio devido processo legal.
Também não se pode olvidar de que prosseguir com o interrogatório de pessoa que tenha decidido exercer o direito ao silêncio, com a finalidade de prejudicá-lo,
beneficiar a si ou terceiro ou mesmo por mero capricho pessoal, pode caracterizar crime de abuso de autoridade, nos termos do art. 15, parágrafo único, da Lei 13.869/19.
Considerando que a Segunda Turma do STF já se posicionou sobre a existência da faculdade de o investigado não comparecer ao ato a que tenha sido intimado (HC 171.438/DF), como manifestação do seu direito fundamental ao silêncio, coerente é que, uma vez que escolha comparecer, não seja compelido a falar.
Recentemente, também no contexto da CPI da Pandemia, o ministro Cássio Nunes Marques deferiu uma liminar em mandado de segurança assegurando que o paciente tivesse o direito de não comparecer à CPI, ainda que devidamente intimado. Segundo a decisão, em que pese não ter havido clareza quanto à natureza da convocação, se na qualidade de testemunha ou de investigado, pelo teor do ato convocatório foi possível concluir se tratar de investigado, o que garantiria a faculdade em relação ao comparecimento ao ato. Adicionalmente, o referido ministro determinou que, caso o investigado optasse por atender à intimação, haveria também o resguardo do seu direito de se manter em silêncio e de não prestar compromisso de dizer a verdade (MS 38.195).
Sob o ponto de vista legal, impinge igualmente rememorar que o art. 186 do Código de Processo Penal assegura ao interrogado que, após devidamente qualificado, seja informado do seu direito de permanecer calado.
O legislador entendeu que todas as informações que extrapolem a qualificação (em alguns casos, por si só, podem levar a uma autoacusação) já se encontram amparadas pelo princípio da não autoincriminação em sua vertente de direito ao silêncio. Porém, esse entendimento ainda não está sedimentado nas decisões judiciais.
Portanto, manter o investigado em interrogatório sob ameaça de prisão, após a sua qualificação e manifestação sobre sua intenção de permanecer em silêncio, representa uma forma de coação psicológica, atual e física iminente (possível prisão), e um verdadeiro constrangimento ilegal, podendo até configurar abuso de autoridade.
Além disso, no caso da CPI da Pandemia, a transmissão em rede nacional em um cenário de comoção pública em torno do tema configura uma valoração negativa do silêncio e, inclusive, execração coletiva do indivíduo, ainda mais com ameaças de punição, mesmo que veladas ou infundadas.
Tudo isso não viola apenas o direito constitucional ao silêncio, mas sim a própria dignidade da pessoa humana, tratando o investigado não como sujeito de direitos, mas como objeto da persecução penal, aos moldes inquisitoriais, demonstrando um retrocesso injustificado e inconstitucional.
A CPI e o princípio da não autoincriminação/doutrina, 1
FILIPE LOVATO BATICH: A CPI e o princípio da não autoincriminação/doutrina, 1
RHASMYE EL RAFIH: A CPI e o princípio da não autoincriminação/doutrina, 1
FICHA TÉCNICA // Revista Bonijuris Título original: A CPI da pandemia e o princípio da não autoincriminação. Title: The CPI of the pandemic and the principle of non-self-incrimination. Autores: Filipe Lovato Batich. Advogado associado da prática White Collar & Compliance do Madrona Advogados. Mestre em Direito Penal pela Universidade de São Paulo (FD-USP). Professor Universitário. E-mail: batich@globo.com. Rhasmye El Rafih. Advogada associada da prática White Collar & Compliance do Madrona Advogados. Mestra em Direito pela Universidade de São Paulo (FDRP-USP). E-mail: myeelrafih@hotmail.com. Resumo: A natureza jurídica de autodefesa negativa que ostenta o princípio da não autoincriminação assegura a inatividade do investigado ante apurações em seu desfavor, ainda que potenciais. O investigado possui ampla liberdade de decidir o que responder ou se não deve responder. Manter o investigado em interrogatório sob ameaça de prisão, após a sua qualificação e manifestação sobre sua intenção de permanecer em silêncio, representa uma forma de coação psicológica, atual e física iminente. Um verdadeiro constrangimento ilegal, podendo até configurar abuso de autoridade. Abstract: The legal nature of negative self-defense, which bears the principle of non-self-incrimination, ensures the inactivity of the investigated in the face of findings in his disfavor, even if potential ones. The investigated has ample freedom to decide what to answer or not to answer. Keeping the investigated under interrogation under threat of arrest, after their qualification and manifestation of their intention to remain silent, represents a form of psychological, current and imminent physical coercion. A real illegal embarrassment, and may even represent an abuse of authority. Data de recebimento: 01.09.2021. Data de aprovação: 01.10.2021. Fonte: Revista Bonijuris, vol. 33, n. 6 – #673 – dez21/jan22, págs … . Editor: Luiz Fernando de Queiroz, Ed. Bonijuris, Curitiba, PR, Brasil, ISSN 1809-3256 (juridico@bonijuris.com.br).
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QUEIJO, Maria Elizabeth. O direito de não produzir prova contra si mesmo: o princípio nemo tenetur se detegere e suas decorrências no processo penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. 1 CASTRO, Rodrigo; MERGULHÃO, Alfredo. CPI da Covid: Wizard respondeu 71 vezes que ficaria em silêncio durante depoimento. O Globo, 30 jun. 2021. Política. Disponível em: https://oglobo.globo.com/brasil/cpi-da-covid-wizard-respondeu-71-vezes-que-ficaria-em-silencio-durante-depoimento-25083886. Acesso em: 20 jul. 2021. 2 O art. 2º, I, da Lei 9.296/96 impõe a necessidade de existência razoáveis de autoria ou participação em infração penal para sua autorização. 3 A dicotomia de classificar um indivíduo ao mesmo tempo como testemunha e investigado não foi realizada em outras liminares concedidas a depoentes da CPI da Pandemia. Veja-se BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Medida cautelar no Habeas Corpus 204.422 DF. Disponível em: http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/HC204422liminar.pdf. Acesso em: 21 jul. 2021. 4 Nas hipóteses em que terceiros forem prejudicados, o agente poderá incorrer em denunciação caluniosa (art. 339 CP) e comunicação falsa de crime (art. 340 CP).